domingo, 21 de novembro de 2010

E foi-se a Maratona de Curitiba!

Eram 5 horas da manhã quando o relógio despertou. Apesar da ansiedade extrema desde dias antes, um pouco de música calma e um bom banho fizeram-me relaxar antes da noite. Dormi muito bem, e acordei ainda melhor.

A canelite na perna esquerda sumira, pelo menos para caminhar. Às 5h50 minha mochila estava pronta, e eu estava de café tomado e vestido de "maratonista". O dia chegara, o dia finalmente chegara. Eu não cabia em mim de tanto ânimo.

Cheguei lá a tempo de ver as meninas passarem por nós, pontualmente às 6h30. Gritei para a Nádia e a Tânia, doando-as um pouco de energia extra - apesar de considerar que elas não precisariam (pensa em duas corredores muito fortes!!).

E então fui para a tenda da V8, para o aquecimento e alongamento. No aquecimento, a cada passo eu sentia uma pontada na canela. Racionalmente, eu não devia estar lá. Mas convença alguém que, por 3 meses, mastigou o desejo de viver aquilo; que abriu mão de voos, de saídas, de festas, por conta do "longão do dia seguinte". Nas quartas-feiras, eu acordava às 6h para ir ao parque treinar. Eu acordo às 8h normalmente, mas acordava às 6h para seguir a planilha. A ideia de desistir por conta de uma inflamação na perna que resolveu aparecer 10 dias antes da prova sequer passou pela minha cabeça.

O problema é que eu fiquei 10 dias sem treinar, e estes 10 dias saíram caro. Ganhei algum peso neste meio tempo, e perdi um pouco do ritmo. Para compensar isso, segurei o ritmo em 5:15/5:20. Não ajudou muito. Já na largada eu me sentia pesado e cansado. E a canela não queria ajudar.

O Tiago, que também treina na V8, iria fazer 21k para este ritmo, e seguimos juntos por um bom trajeto. Foi uma companhia muito bacana, demos algumas risadas no caminho e nos desgarramos no km 13. Apesar de ele ser mais forte do que eu, não estava num dia bom e baixou o ritmo ali.

E foi neste momento que eu prestei atenção na minha perna esquerda. A verdade é que eu não fazia um movimento de "corrida" com ela. Ela havia endurecido e era um bloco só correndo, como que não tivesse joelho. O corpo é mesmo incrível: para evitar a dor, ele simplesmente mudou a minha mecânica. Mas é claro que o preço disso não é baixo, e eu já sabia disso quando optei por correr mesmo com a inflamação.

Chegamos ao Pinheirinho com 19 ou 20 km, e eu caminhei um pouco. Mas não por quebrar. Eu não conseguia baixar meu batimento cardíaco, e isso somado à perna "manca" me alertou: eu devia controlar muito bem a situação agora!

Aqui, eu pensei em desistir, parar, aguardar o Tiago e voltar de carro junto com ele. Então lembrei do nosso longão em que eu quebrei, e me toquei que 42km "não era tão mais longe" do que eu já havia ido. Eu tinha que continuar. E não hesitei em volar a correr.

Mesmo caminhando eventualmente, meu ritmo não ficou ruim. As sonhadas 3:30 já tinham ido por água abaixo tempos antes. Então, agora, a meta ficou em volta das 4h. E no 30 eu estava com 2:56, mesmo tendo caminhado relativamente muito. Estava bom!

E daí pra frente foi que eu abri mão. Guardava energia nas subidas, e corria sempre que me permitia. Na verdade, eu tinha mais perna do que parecia, mas considerava isso bom. Até o 37 não senti quebrar realmente, eu estava somente controlando a energia. Caminhava muito, é fato, mas talvez por inexperiência e medo.

Do km 38 pra frente, a maratona começou de verdade pra mim. Eu esqueci de tomar gel, usava três copos d'água a cada posto e cheguei a jogar isotônico com água na cara para refrescar. O sol pegou, e a energia já se tinha ido. Ali, era a garra, o coração, e usar a energia que todos os meus amigos haviam me enviado.

Mesmo caminhando eu dosava o ritmo. Nunca abaixo de 10min/km caminhando, e correndo eu não me preocupava com nada. Parava ao primeiro sinal de câimbra, este era o meu dosador.

Assim que virei na Cândido de Abreu e vi, lá longe, a chegada, senti um sopro no corpo todo. Uma dose altíssima de adrenalina fora injetada, incrível. Liguei o iPod e comecei a correr, decidido a correr o último km inteiro. Não consegui. Quase chegando no km 42, quebrei novamente.

Mas a visão logo se refrescou. Meus pais e a Isa estavam lá. Me viram, levantaram os braços, e gritaram "VAI"! Eu fui. E fui sem dó.

Quando voltei a correr, não tinha mais energia - sequer para fazer os 195m que, nesta hora, parecem 3km. Então comecei a gritar, sacudir os braços e pedir que as pessoas que assistiam gritassem também. Literalmente levantando os que assistiam ali. E acho que consegui. Não tenho certeza, porque daquela hora não tenho mais certeza de nada. Eu sei que eu senti as pessoas gritando junto, e isso funcionou. Como uma onda mesmo, eu fui passando, gritando, levantando os braços, e todos me deram a energia que faltava.

Cruzei a linha de chegada aos berros. E fui ao abraço dos meus pais, amigos, treinadores e todo o resto.

Muitos maratonistas dizem que a maratona começa no km 30 - antes disso é só administrar. Mentira. A maratona começa 4 meses antes, quando você coloca isso como seu objetivo e começa a treinar para ele. Os longos, os tiros, as lesões, as dores, os novos amigos, as ausências com os velhos amigos...

Quem não é maratonista jamais entenderá o que se passa, jamais compreenderá o quanto importante é cada "boa sorte", cada "VAI", cada palma que recebemos antes e durante o percurso. E eu não os culpo.

Aliás, pelo conrário. Talvez, eu deva um pedido de desculpas geral a todos os que me acompanharam neste trecho. E, mais que desculpas, um MUITO OBRIGADO. Aos amigos (principalmente do voo), à família, aos amigos próximos e aos nem tão próximos assim, meu mais sincero muito obrigado. Obrigado por entenderem, e aturarem, esta meta que coloquei para mim de terminar esta maratona. Tenho certeza que compensarei, aos poucos e do meu jeito, cada ausência, cada recusa de convites, cada decisão aparentemente antissocial que tomei nos últimos meses. Obrigado também ao Vitor e à V8, cujo apoio e assessoria foram essenciais para tornar esta meta factível!

Também, preciso agradecer ao Tiago, aquele que correu o começo comigo. Ele não sabe ainda, mas ele é que foi responsável por manter minha cabeça inteira. Numa conversa descompromissada no Barigui, ele virou pra mim e disse "ah, cara, eu não acho que quem caminhe tá errado; é melhor caminhar do que se matar!". Isso foi há umas 3 semanas, e trabalhei muito isso na minha cabeça - principalmente quando percebi que correria lesionado. Foi, com certeza, curtir esta maratona independentemente de ter caminhado!

E é fato sim que eu fiz bem acima da minha meta. É fato que eu caminhei. E é fato que eu apanhei desta prova. Mas a maratona é uma prova pessoal, não é para os outros. Com a medalha em mãos, eu posso fazer dela a memória que eu quiser - sem medo de exceder o egoísmo. E, com todo egoísmo que me cabe, eu encho o peito pra dizer: EU SOU MARATONISTA. E ninguém me convence do contrário. A partir de hoje, o meu nome vem acompanhado de um número. 42.195. Esse é meu número. ponto.

No www.linhadechegada.com está publicado o tracklog, informações de velocidade e batimento km a km...

14 comentários:

  1. Henrique,
    Parabéns!!! Pela determinação, empenho, esforço, e toda dedicação sua... Você consegue transmitir muito bem em palavras o que você vivenciou na maratona... e isso só me motiva ainda mais a continuar correndo..até quem sabe um dia.. participar de uma maratona...
    Bjs

    ResponderExcluir
  2. Henrique 42.195....que depoimento lindo!!!
    Cara, vc como corredor é tão bom qto escritor. Conseguiu relatar a "alma" de um corredor de Maratona.
    Parabéns, vc foi um grande exemplo de força, determinação, de percepção e cuidado com seu corpo e sua cabeça.
    Orgulho de vc, muito orgulho. Bj!

    ResponderExcluir
  3. Muito bom, parabéns!!!
    Emocionante relato!!
    Eu vou para 2011!
    Beijos!!! =)

    ResponderExcluir
  4. Parabéns Henrique! Pelo jeito a prova foi dura mesmo. O Luiz, que se preparou bastante também sofreu bastante. Acho que o sol e o calor pegou a galera.

    Abraços!
    Rodrigo Stulzer
    transpirando.com

    ResponderExcluir
  5. Já te disse uns 14 parabens hj.. aqui vai mais um !!

    parabéns !!

    e palmas para vc !!

    clap clap clap !!

    ResponderExcluir
  6. Você é uma inspiraçao pra mim!
    Amo vc demais menino!
    :-)

    ResponderExcluir
  7. Bem.. acho que todos que comentaram aqui acompanharam, de perto ou de longe, essa vitória. Nas entrelinhas do texto, com certeza estão os nomes de cada um de vocês... Obrigado, pessoal!

    ResponderExcluir
  8. É isso aí!!! Tem q ter orgulho de - literalmente - ter suado a camisa e vencido seus próprios limites!! Parabéns!!!

    ResponderExcluir
  9. AEEEEE!!! Parabéns explicitados aqui também =P

    Nat.

    ResponderExcluir
  10. Emocianante seu relato Henrique! Aguardo anciosamente a minha vez de completar os 42.195 m. Parabéns pela façanha.

    ResponderExcluir
  11. Henrique, eu tb quebrei nessa que foi minha 1º maratona.Não por motivos físicos, mas meu estômago e minha barriga me derrubaram.Corri até o km 26 sem problemas, daí em diante foi um sofrimento só,até pausa pra ir no banheiro teve. Ali no km26 terminou meu sonho de finalizar em 3h40m, mas mesmo andando muito fechei em 4h08m,por pura teimosia. Cada longão solitário (fiz todos sem companhia ) serviu pra me empurrar.Mas outras virão, e vamos vencê-las.Abraços

    ResponderExcluir
  12. Isabel, terminar a maratona já é uma vitória, não é?! Eu saí desta prova sem dúvidas disso... Mas com certeza faremos nosso tempo esperado, e isso será breve. A intenção antes da lesão era pra 3h30... Depois da lesão era sair vivo mesmo rs... E agora, semana passada, retomei os treinos - de leve, mas voltando... Bons treinos aí, e vamos para a próxima!!

    ResponderExcluir
  13. Cara, show de texto. É por estas e outras que a minha primeira maratona irá demorar um bocadinho..... Vou correndo as minhas Meias, inteiro!!!

    ResponderExcluir
  14. Olá, Henrique, estou passando na corridinha rápida para conferir seu post e te desejar um maravilhoso final de semana.
    \o/ simbora correr,
    \o/ Bons treinos,
    \o/ Boas energias,
    @marlipalugan
    www.marlipalugan.blogspot.com

    ResponderExcluir