domingo, 15 de novembro de 2009

Voa porque tem "robada", ou tem "robada" porque voa?

Robada (sic): para a comunidade do vôo, robada é qualquer lugar difícil de sair, difícil de pousar, difícil de ficar, quente demais, frio demais, molhado demais, sujo demais, com árvores demais, com mato demais, com bichos demais, com cercas demais, difícil de achar, deserto demais ou longe demais. Pode ainda ser agravado por falta de água, falta de comida, falta de ânimo ou vários pilotos passando voando por cima de você, enquanto você guarda seu equipamento sem a menor noção de como sairá dali!

Aconteceu neste fim de semana, na pequena e pacata cidade de Ivaí/PR, a 5ª etapa do Campeonato Paranaense de Parapente de 2009. E nós, animados com a previsão de chuva e sem a mínima pretensão de bons vôos, fomos prestigiar o evento e encontrar os amigos. Sexta-feira, às 18h, estávamos na estrada eu, a Glau e a Luvas, rumo ao sol poente!

O caminho revelou um céu tão belo para fotos quanto terrível para os que voam, com um CB enorme alaranjado pelo pôr-do-sol. Admiramos aquela cena por alguns instantes, até que o sol se pôs de vez. E ainda não eram 22h quando chegamos na cidade!

Com o "local de dormir" devidamente localizado, fomos encontrar um restaurante. Perguntamos a um rapaz na rua que, atencioso, nos deu uma notícia um tanto quanto quadrada: "ué, mas Ivaí não tem restaurante! Só tem lanchonete por aqui...". O minuto de silêncio estava firmado quando ele teve uma luz, e nos informou de uma pizzaria na entrada da cidade. Já que pizza é bom até quando é ruim, nem hesitamos: foi lá mesmo!

Na Pizzaria MP, cuja impressão transmitida é que era de um casal jovem e esforçado, encontramos os grandes, digo, nem tão grandes mas muito estimados amigos do oeste, o Schmia e o Deonir. Comentei com este, que havia chegado já cedo e feito um pequeno voo de reconhecimento, o que eu pensava sobre o local: "Ivaí é um robadinha", eu disse. Ele riu, e complementou "uma robadinha é uma robada mais ajeitadinha, é isso?!". E pedimos a pizza...

Pouco tempo depois, Marquinho Bombeiro,  Eloi e Edu Bombeiro juntaram-se à trupe que chegara na cidade "no dia antes", e nos deliciamos com as pizzas gigantes (e boas!) do local. Por opção, ou pela falta de, o local está recomendado!

Cancelamos a missão "dormir no barracão" e fomos para o Hotel Brizzola, um local também ajeitado onde consegue-se um quarto por R$20 com banheiro coletivo, ou R$25 com banheiro privado. Fomos muito bem recebidos lá também, e o café simples na manhã seguinte (café, leite, pão e "coisas de passar no pão") não deixou nada a desejar.

E daí, check-in do evento e fomos para a rampa. O vento de cauda não foi dos mais animadores, mas a organização impecável da federação paranaense tornou o evento mesmo assim legal ao fazer um belo check-in, prover um transporte eficiente para os pilotos, e ainda ao colocar espetinho e água gelada na rampa - fora a tenda de circo, armada para nos fazer sombra. E ainda, finalmente, ganhei uma camiseta desse tal CPP 2009! :- )

Com o passar do dia, o público foi chegando à rampa. Motoqueiros, "ciclistas", gente de carro e gente a pé compuseram os "cuméques" da rampa, com olhos admirados e arregalados, e espantados com "a coragem desse povo que pula daqui!". E a energia deles foi tão boa que o vento virou. E alinhou. E a prova saiu. E a gente decolou!

E daí pousou. Alguns mais rápido, outros menos. O meu voo demorou 12 minutos, mas foi divertido apesar dos pesares. Em Ivaí, os vales formam um relevo extremamente técnico e traiçoeiro, mas também muito bacana. Há muitas opções de "escoragem" (para subir e/ou para se machucar), e voar com certo grau de consciência no local é importante! Não tenho certeza de que o local seja apropriado para alunos ou gente com muito pouca experiência (não é que eu tenha muita, mas enfim)...

À medida que se voa para dentro do vale, ou mais para perto das "paredes" dele, fica muito nítida as diferenças de vento. Também, o pouso é longe e dificilmente se chega nele, e ainda há árvores por todo o caminho - que, por sinal, não é plano, é encosta. Ou seja, quem não chega no pouso oficial tem grandes chances de arborizar, ou varar o pouso e arborizar lá embaixo, ou se machucar ao ser surpreendido por algum dos ventos que o vale pode formar. Mas graças à habilidade dos presentes, porém, ninguém se machucou nem arborizou!!

No mesmo local onde pousei, pousaram outros 7 pilotos. E fomos todos para a beira da estrada, onde fomos resgatados e poucos minutos depois encontrávamos todos os outros pilotos. O Tumati, presidente da FVLP, sugeriu ao motorista que parássemos num bar para tomar uma gelada (uma água gelada, no meu caso) antes de irmos embora. E lá fomos, felizes, alegres e contentes...

E todos fizeram a alegria do dono do mercadinho. Entre cervejas, refrigerantes, bolachas baratas e salgadinhos vencidos, o sorriso voltava a estampar a cara suada daquele bando fedido de pilotos pregolentos. :- )

"Então vamos?" "Vamos!" E todos entramos no ônibus... Mas, de repente, algo estava errado. O Pudim mostrou algum ferro quebrado e disse "olha aqui, galera, se ferremo! haha". Demorei pra entender, até que tudo ficou claro: o câmbio do ônibus tinha quebrado! Estávamos no meio de um nada, onde haviam poucas casas (e um mercadinho simpático, mas sem vergonha), longe de tudo e de todos, nossos equipamentos já tinham voltado pra cidade, e estávamos sem transporte. ROBADA!!

Mas eis que o milagre aconteceu. Algum desses filósofos disse que sorte é quando acontece algo para o qual você está preparado para reagir. Neste caso, então, tive a impressão de que todos os pilotos ali nasceram em noite de lua cheia, e com a bunda virada pra ela. Pois foi muita sorte!

Pense que, ao lado do mercadinho, tinha uma oficina de tratores - que possui um equipamento de solda industrial. Agora pense, também, que um de nossos pilotos, que aliás é o Pudim, mexe com ferro e aço há 500 anos - e, portanto, é um exímio soldador! E pense, por último, que as câmeras estavam todas com pilha para fotografar toda essa birosca!! O evento foi histórico. O ônibus quebrar no meio do nada, mas um nada que possui uma solda industrial, e um dos passageiros ser um soldador de primeira... foi pra virar crente e rezar pra agradecer!!

O único problema foi que a solda não alcançava o local: tínhamos que mover o ônibus cerca de 20m para trás, na subida. Problema simples, se você pensar que haviam mais de 20 pilotos lá dentro. Nem tão simples se pensar que metade ficou fazendo gracinha pra foto, alguns ficavam fazendo gracinha pra nós mesmos - e alguém ainda tinha que fotografar!!! Mas deu tudo certo... Empurramos o bicho e correu tudo bem!

Umas duas horas depois, admirando as paisagens fantásticas que os vales de Ivaí possuem, estávamos de volta ao centro de eventos da cidade. Um CB novamente fenomenal se aproximava, e optamos por vir embora no próprio sábado, abandonando a etapa...

Algo que sempre fica marcado, ao menos para mim, é o quanto "vivemos" ao fazer as coisas. Mesmo com um tempo medonho, uma previsão ainda pior e uma cidade bem pouco turística, o "dia e meio" em meio aos amigos foi suficiente para lavar completamente o tédio e a preguiça. Chegamos novos em Curitiba, ainda às 22h30 de sábado, e cada um foi para a sua casa. E ainda tínhamos domingo para curtir!

Se eu gostei do lugar? Certamente - mas só para voo. A cidade em si oferece poucos atrativos para eventuais namoradas, esposas ou - pior - filhos que queiram acompanhar... Ainda assim, Ivaí tem um potencial fantástico de voo (na minha opinião), inclusive para triangulações de quilômetros a fio. O relevo e as paisagens do local estão mesmo entre as mais belas que já vi. Mas é preciso que o clima ajude, e muito... Neste fim de semana, a viagem foi apenas boa para darmos boas risadas - e viver boas robadas. E aí é que vem a pergunta: a gente voa porque tem robada, ou tem robada porque a gente voa? Abraços, e ponto!

As fotos são da minha primeira ida à Ivaí, e as do ônibus tiradas pela Glau; as outras fotos da etapa aparecerão em breve nos Picasas do pessoal que levou máquina, como o do Ronnie.

3 comentários:

  1. Hahahaha... excelente descrição como sempre Henrique... ri muito ao ler e lembrar das encrencas... hahaha
    Obrigado tbem por elogiar a organização do evento. Nos esforçamos muito para que seja, antes de tudo, um evento de voo. As vezes pode até faltar algo de conforto, mas em relação ao voo, sempre tentamos fazer o melhor.
    Uma pena que vocês voltaram antes... no domingo rolou mais um prego Homérico.. haha :P
    Espero encontrá-lo novamente em tibagi, ou antes se o tempo deixar, e vê-lo regularmente no CPP 2010 que promete ser melhor do que o de 2009.
    Valeu

    Leandro

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  2. "parássemos num bar para tomar uma gelada (uma água gelada, no meu caso)"

    Mentira !! Eeeu te vi tomando Sukita e comendo bolacha de R$ 0,70 gordurosa..
    hahah

    Flw !

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  3. Interessantíssima a descrição do texto!!!

    Pq não me contou isso ao vivo?!

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